"O dia da espiga era também o "dia da hora" e considerado "o dia mais santo do ano", um dia em que não se devia trabalhar. Era chamado o dia da hora porque havia uma hora, o meio-dia, em que em que tudo parava, "as águas dos ribeiros não correm, o leite não coalha, o pão não leveda e as folhas se cruzam". Era nessa hora que se colhiam as plantas para fazer o ramo da espiga."
Esta do "Não se devia trabalhar..." tou totalmente de acordo!!!!!!!!!!!!
Saudades do tempo em que era uma menina, e que vivia no campo.
A minha mãe adorava comemorar todos os dias festivos, todos, mesmo os mais insignificantes.
O dia da espiga não era excepção.
E o ritual deste dia era delicioso.
Faziamos um bolo. Normalmente de iogurte, que era o mais fácil de ensinar a duas crianças.
ìamos ao campo fazer os raminhos e depois lanchavamos no nosso quintal, porque era mais seguro do que estarmos sozinhas no meio do campo.
Estendiamos a toalha e ali ficávamos a conversar.
Eu, a minha irmã mais nova e a minha mãe.
Não era grande aventura, mas era um momento nosso. (Mal sabia eu a importancia que teriam na minha vida...)
O raminho ficava depois pendurado atrás da porta, até ao ano seguinte, para trazer sorte e saude.
Gostava que o meu filho tivesse esta oportunidade de gostar das tradições, de poder vivê-las. A nossa vida de hoje não nos dá esta hipotese e eu tenho pena por ele.
Se a minha mãe fosse viva, decerto estaria hoje a passear com o neto no campo e a lanchar com ele, no quintal da nossa casa.
E eu teria feito de tudo para sair do Porto a tempo de me juntar a eles numa fatia de bolo de iogurte.
Hoje fui, como habitualmente, ao ginásio na minha hora de almoço.
Eu corro para ir para lá e corro para sair de lá, por isso, este intervalo no trabalho sabe-me pela vida.
Como a aula só durou 50 minutos, pude almoçar no bar do ginásio.
Sentei-me e comecei a comer uma sopinha.
Estava eu a meio da dita, quando chegaram umas tias da minha aula.
Eram umas 5 e por isso queriam juntar mesas. E eu estava precisamente numa mesa a meio de duas outras mesas livres. Ou seja, estava a empatar os planos de convívio das tias. Disseram várias vezes alto "Oh, que pena, não há duas mesas juntas. Ah! Não há lugar para todas...". E eu, nada!!!!
Bem, lá se sentaram ao meu lado, depois do empregado se ter esmifrado todo a conseguir juntar duas mesas, e obrigado literalmente um casal a sair de uma das mesas ás pressas...
E a conversa começou. Jantares, bares, restaurantes, lojas, cabeleireiros, viagens.
E eu a tentar abstrair-me, que afinal de contas, eu vou ali para descontrair e não para ficar com mais nervos ainda.
A dada altura começa a conversa da crise, que isto é tudo invenção, que é uma desculpa, blá, blá.
Dei por mim a pensar, porra, que rica vida!
Mulheres ainda novas, todas bonitas e tratadas e que passam os dias a conviver, vão ao ginásio, á manicure, ao cabeleireiro, saem juntas, fazem viagens...
Mas eu alguma vez tinha pena de não precisar de trabalhar, de ter um marido que me sustentasse e ter esta rica vida????
Qual independência, qual quê?
Queria lá saber de ser uma mulher objecto, toda bonequinha, se não tivesse que andar nesta labuta e a contar os tostões...
Ia mesmo trabalhar, ia mesmo aturar clientes e fazer quilómetros por esse país fora...
Hoje o meu filho foi ao parque aqui em frente a casa, com o pai.
E andava a brincar com os meninos nos baloiços. A dada altura, chegou uma amiga do meu marido com o filho, que é mais novo do que o nosso.
O miúdo, segundo a mãe, é muito reguila e desafia os outros constantemente.
E isso viu-se, porque empurrava os outros, não os deixava escorregar no escorrega, etc.
Entretanto, subiram os dois para o escorrega e o miúdo tentou passar á frente do meu, que estava já no topo do escorrega. E quando o meu marido olhou, estavam os dois literalmente ao murro. O pai teve que subir ao escorrega para os separar.
Resultado:
O outro miúdo ficou com os olhos feitos num oito, sangue a escorrer da boca e bochechas pisadas. O meu levou uns puxões de cabelos e ficou num pranto com os nervos.
A mãe do outro foi para casa por gelo na cara do puto.
O meu veio para casa murcho e ainda levou uma descasca da mãe.
(embora o meu marido tenha visto que o outro andou sempre a desacatar os miúdos todos e que o meu teve muita paciência com ele...não nos cabe a nós encorajar estas coisas e o meu coração está do tamanho de uma ervilha...).
"Fecho os olhos, pensando que não há nada como um abraço depois de uma ausência, nada como encostar o rosto á curva do ombro dele e encher os pulmões com o seu cheiro."
Morar num apartamento foi, durante 25 anos, um verdadeiro mistério para mim.
Isto porque, enquanto fui solteira, morei na vivenda dos meus pais.
Uma vivenda literalmente no meio da parvónia, sem barulhos, sem transito, onde todas as pessoas se conheciam.
Se eu ia da minha casa, até ao café, cumprimentava todas as pessoas que passavam por mim.
E isso dá um bocadinho conta dos nervos, principalmente quando já se está numa fase diferente da vida, em que se namora, por exemplo, e toda a gente comenta, quer saber quem é, e inventa coisas.
Mudar-me para uma cidade grande e para um apartamento, pareceu-me um sonho.
Mas logo no primeiro apartamento onde morámos sofremos com a consequência lógica de viver num prédio.
Os vizinhos.
Tínhamos um terraço enorme, que rodeava toda a casa, e que estava mal isolado, o que fazia com que a casa da vizinha de baixo se enchesse de água.
Acontece que o terraço era considerado parte comum do prédio, ainda que com acesso exclusivo da nossa fracção.
E isto fez com que tivéssemos de esperar que o construtor fizesse as abras. E até que isto acontecesse, a mulher fez-nos a vida negra.
Morámos lá dois anos, até vir para a casa onde estamos actualmente. Um apartamento maior, sem terraços (livra!) onde podíamos fazer nascer o nosso filho, quando decidíssemos tê-lo.
O prédio e muito sossegado, estamos no ultimo andar, e não temos vizinhos ao lado.
Por baixo um casal de velhotes silencioso.
Uma gestão de condomínio meticulosa com limpezas e confusões.
Perfeito.
...
O pior é que no prédio ao lado do nosso, colado , parede com parede com os nosso quartos mora uma família de gente esquizofrénica, para dizer o menor dos seus males.
Pai, mãe e duas filhas lutam entre si, por vezes diariamente e aos gritos.
Já chamámos a policia várias vezes, quando as discussões entram pela madrugada.
Ultimamente as coisas andam muito calmas. E eu andava a estranhar os silêncios. E foi então que descobri que o pai está fora em trabalho há meses, e será ele o pólo destabilizador da casa.
Agora também soube na cabeleireira, que a filha mais velha fez um queixa contra a mãe na protecção de menores e não se falam.
Digam lá se não é uma pérola, esta minha família de vizinhos?
Para celebrar, consegui despachar-me a tempo de sair á hora de sexta (que é as 15h...), estou a acabar trabalho de computador e vou buscar o meu filhote mais cedo.
O pai chega hoje de Londres...só saudades!!!
E hoje, pela primeira vez, o meu filho dormiu na minha cama, aproveitando que o pai está há uma semana fora.
Ofereci-o á minha cunhada Edite, sem o conhecer de todo.
Apenas me despertou a atenção por causa do título. Ela adorou e emprestou-mo.
E agora estou a lê-lo e a adorar.
Fala de uma criança estigmatizada, e com o seu relato emocionado e a sua história de amor, faz-nos acreditar que efectivamente e apesar de muitas vezes a duvida se instalar, existe algo superior que nos protege.